o movimento do entre pelo tempo e pelo espaço, onde cada palavra é figura esburacada, e o rosto de ninguém expande ao infinito.

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

desmentindo a despedida

o processo lento de suas frígidas veias espantam aos olhos atentos. quis movimentar para dentro-fora essa sorte do encontro, escape do êxtase, possível transformação de potencial em coisa feita, fazendo-se, construção de casa. cada palavra caminha para a certeza do fracasso, mas confia no caminho, e sabe porquê pisa. sabe de sabedoria esquecida, sem sentido, longe de conhecer, distante de descrever, fazer tratado, apontar o dedo, discutir o útil . a palavra sabe um olhar vago, reconhecer corpo magro, aceitar fragilidade, abraçar peito entorpecido, é a acolhida do sol quando escolhe subir ao mundo, este mesmo cheio de pernas bambas e tontura vã.
quando te disse que queria lhe escrever cartas, contar meus sonhos, participar de seu rosto, explorar o numinoso, lamber seu suor, compreender seu derretimento, e fazer de toque um corpo-troca, foi uma confissão. quis contar o valor da presença da respiração cautelosa que você lançava sobre mim, como um furacão impedido. gostei da sua confusão, e te falei das faces cheias de sangue, em coração, perpetuadas de coragem; das faces submersas, às vezes feias, mas que são lembrança antes de dormir. as faces que a gente sabe de cor, dos traços, as linhas de expressão, pedaços tortos, que nomeamos e fazemos ser, trazemos à vida, porque somos todos parideiros de chances.
não há estado de pureza, só existe contaminação da árvore no teu caminho, seu pé sujo de terra, os pelos dos gatos no nariz, os olhos mareados, atingidos, preenchidos de verdade, pulsando, sentindo organismo, víscera por entranha, entrega ao absurdo. quando você me disse que gostava da sua solidão, te achei tolo, assim como você acha ingênua a força doada por mim ao alcance do sombrio. o tempo está passando num giro espacial contínuo e repetido, e nossas energias agora nestes corpos tão nossos, tão eu-sou-eu-mesmo, disseminarão em terra ao completar do ciclo invisível. não é como se fôssemos todos os tijolos da parede, mas os caramujos por dentro dela é que nos são.
é com bastante tristeza que escolho compreender o movimento de amorosidade doada, que luta pela presença, que não dá às costas congeladas à indiferença da própria voz que diz. o carinho que você merece de mim é quando nos esbarramos aquele dia, com as mãos cheias de vontade, e escolhi encostar a palma no teu tronco. não porque eu sabia que você iria embora com tanta facilidade, mas porque queria te pedir para ficar, encarar a cara do grande cachorro preto que uiva e morde. se ficasse, perceberia que correr sempre para frente procurando um outro vazio que, no imediato, aparenta luminoso, faz deixar pra trás o detalhe sombreado que contorna a precisão do momento. e então a passagem torna-se borrão atravessado, passos trôpegos, gente bêbada entorpecida de exaustão, chorando questionamento no umbigo, desabrigada, envaidosa, agarrando-se desesperada à troca de peles.

aqui, certa oficialidade exige horas do meu dia para que eu seja oficial. eu, que me estimulo quando corro, dou risada de criança na rua, xingo quem me desrespeita, deixo ver cabelo azul e rosto nem sempre singelo, mas existência inteira. se aprender importância de existência inteira é coisa que não te faz cavar fundo tua terra, plantar uma palavra nova, torcer pra que cresça e chorar quando perceber que cresceu, vou embora tranquila, deixando a ti esse teu mundo tão certo, tão incrementado de experiências grandiosas, tão descoberto pelos auto-seiláoque nos quais tu gosta de se apoiar. um dia, quem sabe, minha lembrança encontre a sua, e você consiga, então, piscar os cílios, e abrir os olhos para o infinito que te espreita. 

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