o movimento do entre pelo tempo e pelo espaço, onde cada palavra é figura esburacada, e o rosto de ninguém expande ao infinito.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Crônica de besteiras

Despertei atrasada de insônia, molenga de manhã dormida. A passos vagarosos, peguei nos braços o gato de minha estima e sentamo-nos na cadeira que vê o dia passar. A janela aberta dava sol de bom dia e brisa de mundo fresco, mantinha-me atenta ao correr da vida, segura em minha preguiça interior. Sem aviso, fui bruscamente interrompida por uma máquina de escrever desgovernada despencando do céu. Atordoei-me no absurdo do evento em questão, sacudindo os olhos para a realidade.
Com pés inseguros para pisar o chão, fui-me até a janela e espiei para fora: um amontoado de velhice jazia caído na grama morta. Enquanto em minha cabeça passava um QUE DIABOS, cortava o ar um novo pedaço de algo que havia sido, quem sabe, um dia. Desviei-me da nuvem em poeira e pensei no terceiro andar, mas não podia ser. Mesmo que meu vizinho de cima fosse um velhinho, as coisas das pessoas não costumam ter sua mesma idade.
O porteiro me disse que tudo vinha do teto. A máquina de escrever que hoje caiu do céu em meus olhos estava, há sabe quantos anos, no teto do prédio. Pode ter sido famosa, pertencido a um escritor franzino e cheio de personagens, como também ter escrito a lauda para o AI 5. Inaugurei a missão resgate da máquina fantasma.
Catei-a, enlameada e gordinha de metais, com o auxílio de mãos maiores que as minhas. A noite foi-se em sabão, água, álcool, lisoform e limpa vidros. Guardei-a como história e símbolo do caos por dias chuvosos.
Contei dela por aí a um amigo que levava linha nos dedos para lembrar-se de qualquer coisa. Ele me disse para aceitar de uma moça bonita a máquina de escrever que me daria por compaixão: que aí você faz uma rede e joga com os amigos. Ofereceu-se para desmontá-la e transformá-la num rádio, para rir-me da beleza nas coisas, essa boba.

Um comentário:

  1. Os dias seriam mais intrigantes e talvez mais divertidos se coisas caíssem do céu sem maiores explicações.

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